sábado, 8 de junho de 2013

Sobre o que nunca pude tocar

Ela era tão bonita que me senti quase constrangido ao lhe dirigir a palavra. Ela era como qualquer mulher, mas sua beleza não era óbvia: existia algo em seus olhos. Ela possuía um par de singelos olhos tristes cor de mel. Que clareavam ao sol pra me fazer lembrar do céu, e que ainda assim no escuro iluminavam meu rosto como fogo em brasa, pra me lembrar do fel. Parecia-se como todas, mas quando a olhei, senti mesmo foi pena de mim. Pobre de mim, coitado de mim. Além de tristes, seus olhos eram distantes. E um olhar distante significa mais do que as palavras podem dizer. Estava de cabeça baixa e quando perguntei qual era o seu nome, ela se ergueu e fixou os olhos em mim, e não posso negar, além de pena de mim, senti medo. Era a primeira vez que eu via alguém tão longe e perto ao mesmo tempo. Ela me enxergava mas jamais seria capaz de me olhar. Não estava ali, e naquela noite eu tive certeza de que aquele era o tipo de mulher que jamais estaria em lugar algum. Aliás, não tipo, porque nunca cheguei a conhecer alguém como ela. Não exatamente. E eram os pequenos detalhes que distinguiam ela do resto que faziam dela tão bonita. Depois que ela disse seu nome, me calei. Além de medo e piedade de mim mesmo, senti vergonha. De súbito e estranhamente, como uma luz queimada que resolve acender. Não me sentia no direito de falar com aquela mulher, havia algo em sua voz que me dizia que não se deve despertar a beleza que descansa em sono profundo. Tudo nela se encaixava, principalmente o sorriso e os olhos. Quando os olhos estavam distantes, existia uma fraca linha abaixo que expressava algum tipo de sentimento ou de palavra que eu nunca cheguei a decifrar. E quando os olhos tentavam focalizar alguma coisa a boca se calava, ou melhor, tornava-se inexpressiva. Porque mesmo sem dizer aquela moça me disse muitas coisas. É claro que eu quis conhecê-la melhor, mas era como um sussurro, um segredo. Eu não quis roubar a moça de uma coisa que nunca cheguei a descobrir. Não quis roubar o seu tempo porque naqueles segundos eu pensei que ninguém jamais tinha me presenteado com tão fantástica visão, e era um insulto continuar ali, desfrutando do olhar vago e fundo de uma moça perdida. Era abuso eu inclusive achar em um primeiro momento que ela fosse perdida, porque por mais que não estivesse ali, tive a impressão de que ela sabia exatamente onde estava. A mulher que quando despedi sem dizer meu nome sorriu me olhando (nunca o contrário). A mulher que me mostrou, naquela noite e em tantas outras que não a vi, que os amores passageiros têm febres fúteis. A mulher que eu tenho certeza que estava sempre se doando, mas nunca se mostrando pra ninguém. Que estava exposta e ao mesmo tempo tinha construído fortalezas dentro de si mesma. E eu me senti vencido por aquela alma. Não que perder possuísse grande significado, mas naquele instante me senti como sangue e nada mais. Aquele olhar e aquele nome jamais me saíram da cabeça, e depois daquele dia, procurei ela em todos os lugares, mas daí lembrei que ela nunca estava, de fato, em algum lugar. Mas estava sempre onde deveria estar. O nome dela? Seu nome era solidão.

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