sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Gotas de silêncio


Ando devagar, sem precisão. Sinto que aos poucos meus pés vão embolar e voar junto com as aves que eu ainda consigo ouvir o canto, apesar de bem distante agora. Algumas gotas da chuva caem em mim, mas elas relutam em ultrapassar a minha proteção invisível. Eu não ligo mais, me tornei impermeável. Estou brilhante e colorida, mas no fundo a chama se esvai com o vento. Não há lugar para correr. E eu nem me importo mais. Faz frio, mas sempre fez frio. Chove e venta. Batem as portas. As janelas. Eu ouço sombriamente o som das forças que querem calar a noite. As minhas palavras não tem mais força porque eu não sei gritar alto o suficiente para calar o silêncio. E eu quero ouvi-lo. Eu digo e digo e digo e digo. Mais uma vez. Rojões de palavras. Dessa vez não sai nada. Impotente. Frustrada. Sensação de que estou falando russo para alguém que só entende chinês. Vontade de sair correndo pra casa. Mas eu quero outra casa. Quero morar com os pássaros. Eu quero deitar e olhar pra onde eu quiser, sem hora pra ir embora. Não é nenhuma novidade a minha vontade de ficar sozinha, mas dessa vez isso superou toda a minha racionalidade. As pessoas separam razão do coração, mas isso não existe. O coração também diz. O coração tem razão. Se você quer muito estar com alguém, mas está cansado de sofrer, e vai embora por esse motivo: aí está o coração. Ele mora nos nossos impulsos e reflexos inexplicáveis. O que a gente diz ou não diz. Aquilo que a gente diz sem dizer. Aquilo que a gente faz sem querer. Aquilo que a gente quer sem fazer. O coração tem razões que a própria razão desconhece. A razão tem coração que o próprio coração desconhece. Pessoas medíocres inventaram, sabe-se Deus lá de onde, essa inútil divisão. Por que? Por que? Por que? Faz tempos que eu me me pergunto os motivos de tudo. Igual uma criança pequena mesmo."Mãe, por que o céu é azul?. Só que eles não existem, é tudo ilusão, fruto da nossa mente. As coisas são o que elas são. Meu maior problema é querer entender. Eu sempre aceito, mas não entendo. Eu só não aceito quando eu não entendo. Eu sou complicada, mas eu não complico as coisas. As pessoas que não param pra pensar com o coração. Só se vê bem com o coração? Pois eu ainda acrescento: só se pensa bem com o coração. Ou não. Por que é que a gente pensa? De novo eu com meus porquês. Eu quero alguém que me dê respostas, mas você não as tem. Eu também não as tenho. Não me olhe com esses olhos. Não me peça pra olhar pra você. Eu não tenho força nas minhas palavras mais, eu não tenho força nos meus pés, mas eu tenho força nos olhos. Tanta coisa vista, e dessa vez eu vejo você dar meia volta e se tornar um incrível besta disfarçado de bom moço. Desconstrução. Estou cansada de desconstruir ideias. Eu mudo e me pergunto por que. Eu vou embora e me pergunto por que. Eu não sei. Existe algo em mim que me fala qual a decisão que eu tenho que tomar. E não é que eu tenha certeza do que digo: eu apenas quero ter certeza. Quero fingir que encontrei as respostas, porque na verdade, eu sei que as respostas não existem. E eu vou correr atrás delas, mesmo sabendo que vou acabar encontrando mais perguntas. Por que? Mais uma vez, não sei. Eu só vejo e observo. Observando a gente esquece de quem a gente é. A gente só é mais alguém num emaranhado de rostos que não possuem foco ou sentido. Observando a gente aprende que somos menos do que somos. Eu me sufoquei com as coisas que não consegui dizer. Eu me sufoco com as coisas que eu digo que só se tornaram mais uma de minhas estranhas observações. Eu sou diferente. Deve ser isso, eu aceito que existe muito de mim em apenas uma pessoa. Eu tento deixar pedaços meus por aí, mas eles sempre encontram o caminho de volta. E eu não entendo. É o caminho das perguntas, eu disse. Só que dessa vez eu quero silêncio. O silêncio de quem está perplexo na sua perplexidade. Um minuto de silêncio pra mim. Eu mereço silêncio para ouvi-lo.