terça-feira, 12 de agosto de 2014

Infinito

A incrível história da menina que passou a infância na selva africana



No dia em que você foi embora pela terceira vez naquele mês, eu pisei forte no chão da minha casa como os soldados na Segunda Guerra mundial e caí na minha cama como um bicho muito pesado que não tem noção do seu peso. Foi aí que, cansada das pessoas, comecei a tagarelar, meio sem voz, com a minha cachorra. Até que, em dado momento, eu lembrei com pesar que ela já estava lá meio velhinha e logo ia me deixar também e fiquei com uma raiva tão grande do mundo que nem sei se existiria alguma coisa depois daquilo. Eu nem sei. Olhei novamente para ela e acho que a pobrezinha estava chorando. Ou talvez eu. Sei lá, me bateu uma baita pena de mim que estava limitada a minha condição de gente, e amando tanto um animal que logo ia morrer que pensei em me jogar em qualquer lugar só pra que ninguém olhasse mais pra mim ou nunca mais me deixasse olhando para as minhas próprias mãos em busca de alguma coisa que eu juro, estava ali, mas sumiu. Minha cabeça doía de cansaço e a minha cachorra continuava olhando pra mim. Foi aí que fiquei com raiva dela também porque me vem esse ódio enorme de todas as coisas que me limitam a um amor tão grande e tiram a razão do meu corpo como se retira um órgão. E a tirei do quarto. E fico olhando as minhas mãos me odiando também por amar assim, não com a pureza de uma criança, mas como o Ghandi que fez greve de fome, como o louco que foge do hospício procurando o sol, procurando o sol, em busca do sol. Porque a vida quer me engolir, mas eu conseguia suportar porque com você a vida arde de uma angústia enorme como um náufrago no meio do mar que só vê imensidão. E é avassalador, mas eu conseguia aguentar as presas enormes da vida. Mas agora eu sinto que ela vai acabar comigo, e trouxe a minha cachorra de volta pro meu quarto porque mesmo com pouco tempo de vida ela é a única coisa que apazigua o inferno do meu coração e que, mesmo se eu abrir a porta, não irá embora. Porque ela não é um pássaro  e sim um animal cujo coração é a sua própria liberdade e isso o faz ficar. E dormi a noite inteira abraçada com os pelos brancos, desejando ao meu peito liberdade infinita. Dormi quase como se eu nunca fosse acordar, e acordei com o sol do louco no meu rosto. E só não o odiei  também porque a vida quase me engole mas não me destrói. E porque meu peito sempre dói como um admirador do mar desesperado para achar a praia, mas é a única coisa que me faz continuar vivendo.

Um comentário:

  1. O único jeito de viver com um coração desses(sei como se sente pois um similar bate aqui em meu peito) é aproveitar cada momento,cada pessoa,ou animal(tambem tenho uma idosinha)....viver de "instantes-ja" como diria a Clarice.Porque nunca se sabe quanto um momento vai durar,ou quanto tempo alguem vai ficar na sua vida

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