terça-feira, 30 de julho de 2013

Frio

Na última segunda-feira quando nos encontramos, eu cheguei em casa como se tivesse levado uma surra. Depois de 2 anos e meio, longos, por sinal, eu finalmente tive a minha chance. Depois de terminar o meu primeiro e conturbado namoro, eu não sei o que me deu para procurar você no meio da madrugada. Eu não fazia ideia se você estava com raiva, triste, entorpecido, feliz, ou se simplesmente tinha esquecido o meu nome, mas resolvi te chamar. Como já dizia a minha psicóloga, é como apostar na mega sena. E você, justo você, que raramente perdoa as pessoas, me recebeu de braços abertos quando o que eu mais precisava era alguém pra conversar, apenas isso, alguém que me entendesse, e que pessoa pra fazer isso melhor do que você? Você, que conseguiu me ver mais do que muita gente que tentou bastante. Você disse que achava que me amava, mas eu tenho certeza que não. Você nunca me amou porque você jamais seria capaz de amar alguém o quanto você ama a si mesmo. Isso não é uma ofensa, sempre gritei pra quem quisesse ouvir que você pode ter todos os defeitos do mundo e ainda assim é melhor do que o resto do mundo. É só que eu desacreditei tanto das coisas, das pessoas, a ponto de me perguntar se tudo isso que me rodeia é real. É só que eu sabia que tinha te procurado só pra preencher esse vazio imenso da falta de sonhos e de amor na minha vida, e eu tenho plena noção de que você sabe disso, e mesmo assim você me recebeu tão bem, como se eu nunca tivesse partido. E eu sempre volto porque sou vaidosa também e eu gosto de ouvir promessas vazias, restos de amor, restos de bebida, restos de cigarro. Eu sempre gostei dos restos desde que eles fossem restos vindos de você. Somos como fogo e pólvora e eu não sei até que ponto isso nos aproxima ou nos afasta. Acho que talvez os dois, na mesma proporção e intensidade. A questão é que você me ligou naquela noite vazia e começamos a fazer planos para quando namorarmos, casarmos e tivermos nossos três filhos: o Henrique (egocêntrico que você é), Guilherme e Clarice. E eu discutindo com você sobre como eles seriam educados. E eu me senti, senão feliz, ao menos satisfeita porque aquele restinho de esperança era o que eu precisava e eu sempre me agarrei demais à possibilidade de que um dia ficaríamos juntos. Os dias passavam e eu sempre tive a certeza que era você. E antes de te encontrar minha psicóloga ainda disse que só se casou com o marido anos depois de conhecê-lo, que toda vez que eles se encontravam ela pensava: “é ele, mas não é agora” e eu saí de lá pensando quando seria a hora pra mim. Parece que é sempre a hora errada. Enfim, eu fiquei sentada te esperando quase tendo um troço de ansiedade. Eu só queria te olhar, eu só fui porque eu queria te olhar e ver o que eu sentiria. E eu te esperei, eu sempre te esperei. Quando você chegou eu não soube o que dizer, te ofereci as balinhas que minha psicóloga tinha mandado te dar e me senti como uma criança de 11 anos. Tempos que meu coração não parecia sair pela boca quase. Sempre esse maldito quase. E a gente sentou e começou a conversar e as horas passando e passando e passando e eu não tinha olhado uma vez no relógio. Tomei trauma de todo o tempo que passou devagar sem eu estar ao seu lado. E pela primeira vez, raiva do tempo que passou rápido por eu estar ao seu lado. Você tinha mudado um pouco, estava mais forte, com uma barba crescendo ligeira, mas suas mãos continuavam quentes, seus planos diabólicos eram os mesmos, porém com maior ironia e ódio, e os seus olhos continuavam iguais. Duas pedras negras e brilhantes. Seus olhos, que antes me desviavam o foco, me tiravam do meu lugar e me faziam perder o ar, pela primeira vez, estavam inexpressivos. Ou se não inexpressivos, não faziam, nem por um segundo, o meu coração bater mais forte. Só que conforme os minutos passavam eu ia ficando mais calada, e você continuou falando, você sempre falou por nós dois, e o silêncio, naquele momento, pela primeira vez, foi um pouco desconfortável. Acho que a parte mais triste do amor é quando ele acaba. Pior, quando acaba sem ser. Os segundos passavam e eu ia ficando mais triste porque eu tive certeza de que o tempo finalmente tinha me vencido. Dois anos e meio foram tempo demais pra um coração, pobre coração, que sempre quis te mostrar que era suficiente pra você, que era bom pra você. Eu que sempre quis arrumar a sua vida não consegui nem arrumar a minha. Que vergonha. O tempo me venceu e eu nem reclamei. Cheguei em casa parecendo que tinha levado uma surra porque minhas energias tinham sido esgotadas. Parecia que eu tinha apanhado do tempo, porque eu jurava que iria te amar pra sempre. Eu jurava que você era a pessoa pra mim e pela primeira vez eu duvidei das minhas próprias certezas. Eu não saí de lá com o coração pesado como costumava ficar, eu saí de lá sem sentir o meu coração, porque ver você me fez lembrar de todo o sofrimento, de todo o sentimento, ou finalmente da falta dele. O maior problema de todos é que você não tinha mudado: você ainda é o mesmo menino sem os braços fortes e que sempre teve o melhor abraço do mundo que eu conheci há algum tempo. Você não tinha mudado, o que significava que eu ainda deveria te amar, foi o que me jurei ao menos. O que mais doeu em mim foi perceber que eu não te amava mais porque você continuava o mesmo, e eu, não. Quem tinha mudado era eu. E eu não consigo mais sentir. A parte mais triste do amor é quando ele vai embora sem ter sido. Vai ver porque eu aprendi tanto a não esperar nada de você, que quando você realmente tinha alguma coisa pra me oferecer, eu não consegui esperar grandes coisas. Eu sempre gostei dos seus restos e quando finalmente você não era pra mim um resto e sim você inteiro, eu não quis mais. Eu quis tanto você nesses últimos anos que quando eu finalmente tive a oportunidade de ter você pra mim, eu já não queria mais. Eu sentia meu amor por você aumentar a cada promessa que você não cumpria, mas, que engraçado, hoje você nem prometeu nada e ele finalmente acabou. Acabou quando eu não perdi mais o ar ao olhar pra você. Você não tinha mudado, quem tinha mudado era eu. Eu voltei pra casa como se tivesse levado uma surra e me sentindo uma desconhecida em meu próprio corpo quando me dei conta de que não sentia mais nada. Esse sentimento sempre fez parte de mim, e quando finalmente ele deixou de existir e eu finalmente me dei conta disso, foi a noite em que eu parecia não existir também. Não doeu, mas ainda sim foi como se eu tivesse levado uma surra. Foi como se tivessem dividido a minha alma em mil pedaços. Mas, pela primeira vez, em dois anos e meio, eu fui embora sentindo frio e deixei você esperando o táxi. Eu fui embora antes de você. Fui embora morrendo de frio, mas pela primeira vez em dois anos, não sabia se fazia mais frio fora ou dentro de mim.

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